sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Agora, sim, posso dizer: sou Mestre em Literatura e Crítica Literária!



Agora, sim, posso dizer:
sou Mestre em Literatura e Crítica Literária




Fico a pensar, cá com os meus fantasmas, dois dias após defender a dissertação “Um cerco de Lisboa esteticamente construído entre dois tempos e duas estações” – cujo corpus literário fora o livro História do cerco de Lisboa, publicado em 1989, pelo único Prêmio Nobel de Literatura em Língua Portuguesa, José Saramago – o que seria de mim caso eu não tivesse cursado o Mestrado em Literatura e Crítica Literária na PUC Goiás? Não o que seria de mim em relação à carne, pois esta sabemos bem, que o tempo a urgir, vai lhe arremessando contra a parede; porém, em relação ao espírito, pois este sim, como um bom vinho português, só enobrece com o tempo. E aí fico pensando como estaria o meu espírito caso eu não tivesse todas aquelas horas de leituras e releituras, escritas e reescritas, ao correr da brisa nas madrugadas a fora em pura e eterna solidão. O que seria então de mim, ou melhor, do meu espírito?

Pois bem, a fim de responder melhor, procuro devanear através das seguintes linhas: creio que depois que a gente nasce, o dia mais feliz é aquele em que damos alguns passos por inteiro; depois vem a leitura da primeira palavra, e logo após, como no meu caso, o gosto da primeira hóstia, e o avistar, mesmo ao longe, o azul do mar, “nossa, mãe, como é salgada”; depois segue o primeiro beijo, o casamento, o primeiro choro do filho, e agora, já beirando aos cinquenta, a defesa do mestrado. Simplesmente, uma sensação ímpar, com toda a sua singularidade, e principalmente após ouvir da banca de defesa as seguintes palavras: aprovado com recomendação unânime de publicação e um breve retorno ao doutorado.

Aproveito aqui, para agradecer formalmente a todos aqueles que me ajudaram a vencer esta etapa da vida acadêmica, a começar por este veículo de comunicação, o Jornal Diário da Manhã, na pessoa da jovem jornalista, Sabrina Ritiely, por abrir espaço durante estes três anos de luta, a fim de publicar os meus artigos, ensaios, resenhas e crônicas, como devaneios críticos e literários, que já passaram dos trinta.

Não posso esquecer de agradecer a Pontifícia Universidade Católica - PUC Goiás como instituição, a qual recomendo, e aqui fica um eterno abraço carinhoso à coordenadora do curso, à Profª. Drª. Maria de Fátima Gonçalves Lima, sobretudo em relação ao apoio e incentivo, antes, durante e depois de cursar. Fica aqui também, um beijo enorme no coração da minha orientadora, a Profª. Drª. Maria Aparecida Rodrigues, tanto pelo carinho, as orientações, paciência e compreensão, como uma pessoa de fino trato.

Aos meus caríssimos e amados professores, meu muito obrigado: à Profª. Drª. Maria Therezinha Martins do Nascimento, que além de nos encaminhar nas trilhas do gênero dramático, bem como, da literatura comparada, nos permitiu alimentar de sua prosa pós-moderna, mediante o belo romance “Rapto de Memória”; à Profª. Drª. Lacy Guaraciaba Machado, cuja prudência e lucidez, nos permitiu vislumbrar os pressupostos teóricos acerca da Análise do Discurso, numa bela viagem teórica aos escritos de Michel Pêcheux; ao Profº. Dr. Divino José Pinto, cuja retórica e eloquência, nos enveredou rumo aos pressupostos teóricos desenvolvidos por Gerard Genette e Roland Barthes, aquele abraço; ao Profº. Dr. Éris Antônio Oliveira por nos encaminhar nas veredas poéticas e críticas do francês Gaston Bachelard, bem como, pelos diálogos em que tivemos acerca da crítica literária, seja nos corredores desta instituição, ou nos variados encontros não marcados nas livrarias da capital do cerrado; ao Profº. Dr. José Ternes, cujas viagens em meio à filosofia, nos enviou com toda sua mansidão e doçura em palavras, às linhas francesas de Michel Foucault; e aos professores ministrantes, tais como,  ao Dr. José Fernandes e ao Dr. Gilberto Mendonça Teles.




Até chegar à última linha da minha dissertação, alguns diálogos faceanos foram pertinentes ao processo desta escritura, viabilizando assim a retirada de todas as pedras que estavam no meio do caminho, e entre estes variados diálogos, não poderia deixar de agradecer neste espaço, à pesquisadora Eula Carvalho Pinheiro, amante incondicional da prosa saramaguiana, cujo doutoramento se presta na Universidade Nova de Lisboa; à Drª. Susana Ventura pelas suas considerações a respeito da literatura contemporânea portuguesa; à eterna crítica literária Maria Alzira Seixo, um doce de pessoa; ao amigo virtual e historiador português Paulo Capelo; ao Dr. Cláudio de Sá Capuano, por suas nobres ponderações; bem como, aos variados críticos literários que buscaram refúgio e prazer mediante a estética de José Saramago, e que tive o fervor em buscar auxílio em suas escrituras, e entre estes, não poderia esquecer de nomes como: Vera Bastazin, Simone Pereira Schmidt, Márcia Valéria Zamboni Gobbi, Gerson Luiz Roani, Salma Ferraz,  Teresa Cristina Cerdeira da Silva, Ana Paula Arnaut, Carlos Reis e Horácio Costa.

Assim, dedico a todos estes, como prova de agradecimento, o meu trabalho, fruto de muitas leituras e releituras em madrugadas infindas. Não esquecendo, é claro, da minha esposa Luciene Lago Souza Veiga, amor da minha vida, do meu filho Marcus Simeone Lago Veiga, que para mim é mais doce que o doce de batata doce, da minha querida mãe Elcira Veiga, e in memorian, da minha amada avó Vitalina Fraga; à Luciete Lago Lacerda e filhos, João Manoel e Vitória Regina, pelo apoio e consideração enquanto estive em Goiânia, e a todos os meus familiares, amigos e estudantes de Rondon do Pará que torceram por esta vitória, bem como, a todos os mestres em que tive a oportunidade de estar no banco de aula como aluno, em especial, da Escola Municipal Neder Issa e Colégio Adventista em Governador Valadares MG, Colégio Paraíso em São Gonçalo RJ, Escola Marechal Rondon e UFPA curso de Letras, em Rondon do Pará.

E aí o leitor poderia me perguntar impacientemente – e a Deus, não irás agradecer? Bom, durante os vinte minutos, que tive a fim de defender a minha dissertação perante a banca, um terço de madeira, advindo da bela Igreja de Nossa Senhora de Nazaré em Belém, como presente em promessa da minha amiga e professora Moisiane Felicíssima da Silva, esteve sempre a pulsar no meu bolso, como prova de que, “Tudo posso Naquele que me fortalece”.

Profº. Robson Luiz Veiga
Mestre em Literatura e Crítica Literária PUC Goiás


quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Convite à Navegação!



Convite à navegação;
uma conversa sobre a Literatura Portuguesa.




Mar aberto seria o título que o Prêmio Nobel de Literatura José Saramago daria ao romance Jangada de pedra, obra esta publicada em 1987, e que segundo o enredo, a Península Ibérica se desgarraria do velho mundo a ancora-se no oceano Atlântico, entre as terras africanas e a América Latina, numa proximidade linguística e cultural, alegoricamente descrita neste romance saramaguiano, que discorre sobre o que aconteceria caso esta península se desmembrasse do continente europeu e vagasse pelo mar, como uma enorme embarcação a se aproximar, oceano afora, de suas antigas colônias. Mar aberto também é a obra crítica produzida pela pesquisadora Susana Ramos Ventura, amante incondicional da literatura lusitana, em relação à construção histórica e poética da Língua Portuguesa ao longo do último milênio, sobretudo em referência ao fazer poético traçado pelas linhas ficcionais dos grandes navegantes que utilizaram este instrumento de comunicação, tais como, Dom Dinis, Gil Vicente, Camões, Eça, Pessoa, Florbela e Saramago.

Desde os dez anos de idade, Susana Ventura vem trilhando as estradas poéticas mediante o ato de leitura, porquanto considera a literatura lusitana uma das mais ricas e fecundas do mundo ocidental, e que tende a ter, segundo a autora, maior visibilidade na terra de Drummond a partir da comemoração do Ano de Portugal no Brasil, evento este que a sensibilizou publicar em 2012, o seu primeiro livro solo, após um outro, já editado em março de 2010, Ciranda de escritas: reflexões sobre as literatura do Brasil, Portugal e Áfricas de Língua Portuguesa, em parceria com a pesquisadora Ana Cláudia da Silva.




 Convite à navegação – uma conversa sobre literatura portuguesa, da professora e pesquisadora Susana Ramos Ventura, doutora em Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa pela Universidade de São Paulo, publicado pela Editora Peirópolis, além de conter uma análise histórico-literária do período acima mencionado, também conta com as belas ilustrações da arquiteta Sílvia Amstalden, participante do grupo Charivari, em seu décimo trabalho artístico desta natureza, que numa linguagem singular em forma de imagens, enobrece ainda mais esta obra de Ventura, situando-a como um convite a uma viagem ao mar aberto da Língua Portuguesa, desde a origem, quando ainda se falava o galego-português na terra de Camões - língua essa que teria nascido do latim vulgar, se mesclando depois à chamada língua moçárabe, devido à influência peculiar dos povos mouros que ocuparam do século VIII até o século XII o território lusitano.

Entre a historiografia oficial e à graça da poesia, Ventura inicia sua viagem escritural ao falar das “doces águas da poesia”, atravessando os pireneus à caça da poética trovadoresca produzida oralmente em Provença, e de lá trazendo numa tradução livre o canto do amor de Bernart de Ventadorn, como expresso na bela estrofe, “Cantar não pode valer de nada, se não parte do fundo do coração; e para comover é preciso que lá dentro exista um verdadeiro Amor. Por isso minha poesia é perfeita, porque para gozar plenamente o Amor emprego a boca, os olhos, o coração e o saber”, por onde, o rei sábio, Afonso X, haveria de trazer as cantigas daquela terra e abrir espaço aos trovadores, que, num determinado tempo, haveria de produzir não somente uma gama de cantigas de amor, como também a inovação ao criar a cantiga de amigo, que “Imersa num contexto social, a mulher aparece numa fonte, sob galhos de árvores ou junto ao rio, onde lava roupa ou se prepara para tomar banho. Em algumas dessas canções, ela lembra ou espera pelo amado, evocando sua presença em conversa com elementos da natureza”, como expressa a Ventura.

Como um trabalho singular que oferece ao leitor uma visão peculiar, desde D. Dinis a Saramago, numa linguagem que comporta, tanto o iniciante ao universo da literatura portuguesa quanto ao acadêmico, ao sabor de um bate-papo, Ventura se propõe ao longo do texto, após visitar os trovadores, encaminhar neste diálogo o cronista maior Fernão Lopes, por sua visão de conjunto ao elaborar suas crônicas, “dando relevo, pela primeira vez, ao povo, que considerou como agente de transformações históricas”, para logo após, encaminhar o leitor ao teatro de Gil Vicente, “cuja obra reflete características medievais e também renascentistas”, tendo por destaque, neste navegar de Ventura, os autos e as farsas vicentinas.

O convite à navegação na qual empreende Ventura se encerra ao discorrer sobre a singularidade poética das linhas de Camões, sobretudo, ao pontuar os meandros que cercaram a produção camoniana em torno do mais famoso poema épico em Língua Portuguesa, no caso, Os Lusíadas, como cântico a exaltar o povo português na época das grandes navegações, que salvando o manuscrito da obra num naufrágio, deixou em águas profundas sucumbir o corpo da amada Dinamene. Esta epopeia teve sua publicação referendada pelo rei Dom Sebastião em 1572, “como uma obra plena das aspirações do ser humano da Renascença”, cujo autor, não suportando a perda misteriosa de autonomia de seu amado país em favor da Espanha em 1580, chegou a declarar em carta que “acabarei a vida e verão todos que fui tão afeiçoado à minha pátria que não me contentei em morrer nela, mas com ela”, sintetizando em palavras o que sentira naquele determinado momento mediante o domínio espanhol.

No interior desta viagem, Ventura se ancora em suas ponderações, ao considerar pertinente ao seu processo de escritura, o diálogo entre variados pesquisadores e críticos relacionados ao tema, tais como, Nelly Novaes Coelho que considera Camões a primeira grande voz a cantor o amor em terra lusitana, “como a grande via interior que leva os homens à mais plena realização existencial”, porquanto Paul Teyssier considera a partir daí, a constituição do português clássico, que doravante poucas alterações iriam ocorrer em relação à morfologia e à sintaxe. Além destes, esta navegação conta com certas ponderações do renomado professor e pesquisador Benjamin Abdala Júnior, bem como, do filósofo português Eduardo Lourenço e de Cleonice Berardinelli, esta que, relaciona o processo de escritura da obra Os Lusíadas ao contexto na qual a mesma fora escrita por Camões.  

Ao conversar com o leitor, embora utilizando a pena para tal finalidade, Susana Ventura neste livro, convida-o a navegar pelos mares da inquieta e robusta língua de Camões, nem que seja numa rede preguiçosa pra deitar, caso o mesmo não esteja à beira do Tejo, ao frescor das oliveiras, ou mesmo em sintonia do fado lusitano, pois, como diria Pessoa, “tudo vale a pena quando a alma não é pequena”, presente no curto poema Mar português, ficando doravante, o convite ao amante da eterna Língua Portuguesa a navegar por mares, já ou nunca dantes navegados, e como salienta a autora, “que nos encantam ou que estamos por descobrir”, ou quem sabe ainda, por redescobrir.



                                                                                                           Profº. Robson Luiz Veiga
Mestrando em Literatura e Crítica Literária PUC-Goiás



Drª Susana Ramos Ventura

Doutora em Letras pela Universidade de São Paulo, com tese sobre os romances de José Saramago, Mia Couto e Ana Maria Machado. Pesquisadora do Centro de Literaturas Lusófonas e Europeias da Universidade de Lisboa (CLEPUL) e do Centro de Pesquisas sobre os Mundos Ibéricos Contemporâneos (CRIMIC), da Sorbonne (Paris IV). Autora de Convite à navegação: uma conversa sobre literatura portuguesa e Eu, Fernando Pessoa em quadrinhos (Editora Peirópolis). 

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Rondon do Pará em poemas!






Segundo o revisor Raimundo Benvindo Silva, protagonista do romance História do cerco de Lisboa, de autoria do escritor português José Saramago, único prêmio Nobel de Literatura, “tudo quanto não for vida, é literatura”, ou seja, a literatura é aquilo, que movido pela imaginação, transforma as imagens num jogo de palavras, que encanta os leitores, e vive eternamente no coração de um povo, muitas vezes, sendo a marca de identidade de uma determinada sociedade. Assim cantou em versos Luiz Vaz de Camões, de forma épica, a saga dos lusitanos nos melhores anos desta nação.

O revisor Raimundo Silva, ainda num diálogo denso e ensaístico que move o primeiro parágrafo do livro acima citado, numa comparação com o discurso histórico, diz que a História também é Literatura, justamente por ser construída em forma de textos, na qual a ficção se mescla ao factual. Logo após, este personagem tomado em cepticismo amargo, refere ser a literatura a primeira de todas as artes, pois, “a música anda a resistir desde que nasceu, ora vai, ora vem, quer livrar-se da palavra, suponho que por inveja, mas regressa sempre à obediência”; e ao ser indagado sobre a pintura, “ora, a pintura não é mais do que literatura feita com pincéis, pois quem não pode escrever pinta”, usando pra isto o poder da imaginação.




Tal rodeio, cumpre, acima de tudo, um delineamento sobre o caráter que assume a literatura, sobretudo, aquela cuja forma se dá em versos, no caso, o poema, nas quais suas linhas são enlameadas de poesia.

E por falar em poesia, e por falar em versos, e poemas, por que não tecer uma fala sobre um projeto artístico original construído em solo rondonparaense. Falo sobre o projeto “Rondon do Pará em poemas” - uma bela iniciativa de jovens artistas de Rondon do Pará, a fim de homenagear a cidade no seu trigésimo primeiro aniversário, convidaram alguns poetas, e dos seus poemas, deram vida aos seus versos com belas interpretações.

Um projeto digno de nota! E quem sabe, um retorno aos bons tempos artísticos e culturais vividos por este povo em décadas passadas, e que, no atual momento, depois de dez longos anos com fome e sede de arte, clamam por todos os orifícios, sejam físicos ou espirituais, por campos mais férteis em relação ao desenvolvimento cultural.

E que assim seja!

Aqui é o meu lugar!

“Sinceramente,
Não sei o que me fez ficar!
Talvez, quem sabe, a primeira água do céu que descera naquele janeiro,
Fazendo subir o cheiro doce de terra molhada,
Senti saudade de brincar no barro, no correr da lama, brincadeira de infância!
Talvez, quem sabe, a cor da relva nas águas do Surubiju, 
Bem distinta das outras em que banhei,
Talvez, quem sabe, o gosto da água de cipó, 
Do canto dos capelões, 
Do murmúrio da onça pintada,
Daquela fria e densa manhã, quando pisei pela primeira vez na mata virgem!
Ao longe, dava pra ouvir o roncar dos caminhões,
Sensação única, singular!
Ou talvez, quem sabe, 
O entrecruzar das vozes, das palavras, dos sotaques primeiros, das bandeiras,
Que se instalaram nesta terra!
Sinceramente,
Não sei bem o que me fez ficar
Só sei que aqui estou, 
E, que aqui, é o meu lugar!”

Autor: Robson Veiga

Interpretação: Angêlica Oliveira

click no link e  visualize o clip no youtube, grato!




Série de 6 vídeos com gravações de atores rondonenses declamando/interpretando poemas de poetas da cidade que versam sobre a cidade em homenagem aos 31° aniversário de Rondon do Pará.

Poetas: Dionísio Almeida, Joseilson Meireles, Juarez Medeiros, Maria Nilza Rafalski, Robson Veiga, Rosa Maria Peres Lima

Atores: André Luiz Oliveira, Angélica Oliveira, Larissa Cifarelli, Márcia Azevedo, Meire Lira, Ricardo D'Almeida.

Produção: Cineclube Boravê e Grupo Teatral Nirvana
Edição: Ricardo D'Almeida
Finalização: Samar Souza e Ricardo D'Almeida
Direção e imagens: Ricardo D'Almeida
Figurino: Grupo Teatral Nirvana
Maquiagem: Meire Lira
Fotografia Still: Larissa Cifarelli, Angélica Oliveria
Músicas: http://audionautix.com (licença cc)

Realizado por Cineclube Boravê e Grupo Teatral Nirvana.
Patrocínio da Prefeitura de Rondon do Pará.

31° Aniversário de Rondon do Pará.

sexta-feira, 1 de março de 2013

O caráter dialógico nas obras de Maria de Fátima Gonçalves Lima



Em tempos tão difíceis como aqueles, década de 1970, onde tudo era mais estreito, era um prazer viajar no mundo mágico das estórias contadas por minha querida avó, dona Vitalina Fraga, na beirada romântica da lua cheia, ao pé do morro do Ibituruna, às margens do Rio Doce. Ainda sinto o cheiro e o gosto frenético do jenipapo de Minas, quando relembro daqueles doces e significantes instantes.

Assim, reuniam-se todos os netos, em forma de círculo, ao pé da mangueira, e sempre havia um que dizia, “vó, conta pra gente aquela estória”, e vovó dizia, “mas de novo, aquela estória?”. Aí, tome estórias, de Lobisomem a Mula-sem-cabeça, e outros personagens lendários, sempre mesclados com personagens reais do tempo de minha avó, tendo no bojo do enredo, o estatuto do gênero maravilhoso, que se fazia presente na oralidade das palavras e nas gesticulações que minha avó criava.  E ela sempre jurava ao chegar o fim de cada estória que era tudo verdade, pois ela vira tudo aquilo com os seus próprios olhos, ou às vezes com os olhos da sua própria mãe, e nós, como toda criança, inocentes, acreditávamos piamente em cada signo, pois ao dormir, era difícil não abrir os olhos e verem bem de perto todas aquelas criaturas.

E foi lendo, nesta semana, as obras que compõem a escritura da literatura infantil de Maria de Fátima Gonçalves Dias, entre outras, O castelo da Branca de Neve, Os cabelos de Rebeca, O bezerro e a rainha, A pedra furada, A sopa de pedras e A sopa de Viaro, que cheguei a lembrar desses doces e prazerosos momentos do passado. Momentos raros na contemporaneidade, previstos pelo alemão Walter Benjamim, no seu aclamado ensaio “O narrador”, cuja modernidade estaria contribuindo para o fim da narrativa oral, por não saber mais o homem, intercambiar suas experiências em forma de narrativas. E claramente, nos dias de hoje, dá pra notar o quanto a figura mítica da avó, metaforizada por Monteiro Lobato na obra Sítio do Picapau Amarelo, pela figura de Dona Benta, contadora de estórias, já não faz mais parte deste mundo.



Por assim dizer, os contos infantis de Maria de Fátima Gonçalves Dias, que além de professora é crítica literária, seriam um resgate dos contos infantis da tradição oral, através das lembranças da figura de sua avó, como faz menção a própria autora na contracapa do livro, que “para realizar este trabalho busquei minhas reminiscências de criança, quando minha avó Maroca contava cantando essas histórias”, recriando, tais contos, numa atualização discursiva que chama a atenção do leitor, à procura de extrair o sentido da obra numa relação dialógica com o texto no ato da leitura, sendo, até então, um coautor da obra de arte ao contribui na produção de sentidos no ato da recepção do texto, como teorizava os críticos literários Jaus e Iser, sobre a teoria e o efeito da recepção estética da obra de arte.

 Segundo a pesquisadora paraense, Cirlene da Silva Andrade, Mestre em Literatura e Crítica Literária, em seu aclamado ensaio Dialogismo e recepção estética na obra de Maria de Fátima Gonçalves Dias, a linguagem apresentada pela autora nos contos, funde o tradicional dos contos populares a uma nova postura estética, num diálogo permanente com a literatura oral, a mitologia grega e passagens bíblicas, cujo leitor, é levado ao “desvendamento das metáforas analógicas, dos símbolos metafóricos e da construção do maravilhoso, e ainda a identificação da referência ao mito”, através do ato da leitura, atribuindo sentido na obra de arte literária, por onde a significação encontra-se na junção, entre a linguagem verbal e a imagética, presente nestas obras.


Robson Luiz Veiga
Mestrando em Literatura e Crítica Literária

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Vai, menina, ser-gauche-na-vida!




Vai, menina, ser-gauche-na-vida!



Numa tarde dessas, em que a chuva pede pra cair, mas o sol soberanamente lhe ordena a ficar, deixe-me deleitar nas curtas linhas do pequeno livro Oficina de leitura, da pesquisadora, tradutora e crítica literária Rosemary Arrojo, adepta fiel da consagrada concepção denominada de "Desconstrução", surgida ainda na década de 1960, através da pena do francês Jacques Derrida.

Ao me deparar com a entrada do capítulo 6, denominado de “Exercícios de tradução”, me detive longamente na releitura dos versos do poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade – Poema de sete faces, numa análise minuciosa, apresentada por Arrojo, ao comparar o texto original com a tradução em língua inglesa, da poetisa norte-americana Elizabeth Bishop – Seven-sided poem, após, é claro, o ato de leitura e interpretação da própria Rosemary Arrojo, estabelecendo assim, as diferenças de significado que a mesma fizera da leitura do original em referência à leitura sugerida pelo texto traduzido.

Até aí, tudo bem, deu pra perceber que o processo de tradução de um texto poético, seguindo a linha da corrente contestadora, se origina após o processo de leitura e interpretação, numa perspectiva que delineia o leitor como coprodutor de significados, pois, segundo Arrojo, “ler um poema significa aceitar um convite implícito à criação”, cujo texto, por não ser pronto e acabado,  é uma obra aberta aos olhos do receptor.



De repente, entre o original, produzido por Drummond, o trabalho de leitura e interpretação de Arrojo, bem como, a tradução de Bishop, busquei na feira do tempo, conscientemente, a figura ímpar da educadora paraense Simone Bahia, como sendo o reflexo da simbologia do “ser-gauche-na-vida”, segunda a interpretação de Arrojo, na qual significaria “não ser como os demais, ou pensar como os demais”, mas por ter uma atitude ímpar, singular, entre muitos, e por dizer aberto em sua ética profissional, tatuado em seu espírito uma postura crítica, um dos mais belos versos da musicalidade brasileira – “Não sou escravo de ninguém, Ninguém senhor dos meus domínios”, como pregava Renato Russo, “porque repetir o mundo, ou rimar com ele, não é uma solução”, utilizando aqui, as palavras de Arrojo.




No caso da professora Simone Bahia, um verdadeiro “metal contra as nuvens”, seguindo a linha poética do líder da Legião Urbana, o sistema resolveu lhe castigar por ser-gauche-na-vida, e por não ser um Raimundo a rimar, exonerando-a do cargo de coordenadora pedagógica à professora das séries iniciais. Uma prova viva de que ainda precisamos democratizar a democracia, como bem afirmou a ex-senadora Marina Silva, principalmente em se tratando da rede pública de ensino, cujo princípio básico deveria no abrir das tuas portas, incentivar o hábito da fala crítica dos sujeitos que produzem o processo de ensino-aprendizagem, a fim de que os estudantes possam tê-los como modelos a serem observados como elementos atuantes em prol do desenvolvimento social e cultural.

Afinal, em termos de educação, é melhor ser-gauche-na-vida, correr perigos e correr mundos, do que ficar a viver feito muitos Raimundos, num trabalho que só os papagaios nasceram para tal fim: a repetição do repetível, assentada em versos como estes do Maluco Beleza, “É você olhar no espelho, Se sentir um grandessíssimo idiota, Saber que é humano, ridículo, limitado, Que só usa dez por cento de sua, Cabeça animal”.


Robson Luiz Veiga
Mestrando em Literatura e Crítica Literária

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Borges, a poesia como paixão e prazer!


Especial ao Jornal Opção,
Goiânia

Borges – a poesia como paixão e prazer!

No livro de ensaios “Esse ofício do verso”,
Borges relata todo seu amor pela magia da palavra



Num tom confessional, admitindo ser um pensador levado a timidez, apenas utilizando como ferramenta a memória, o escritor argentino Jorge Luis Borges, convidado como fora com todas as honras pela Universidade de Harvard nos anos de 67 e 68, no auge dos seus sessenta e sete anos, proferiu neste período seis palestras a estudantes americanos do Curso de Letras, com o objetivo de delinear oralmente, todo seu amor pela palavra - seja como leitor, ou como escritor, abrindo o leque das possibilidades que só o verso é capaz, depois que chega às mãos e aos olhos do leitor, num fruir de sentimentos adotados por Borges, como “uma paixão e um prazer”: a simples definição de poesia.

Antes, confinadas num cofre da biblioteca da referida universidade americana, as seis palestras, proferidas na língua inglesa, foram transcritas via fita, para as páginas impressas em 2000, num pequeno livro chamado “Esse ofício do verso” – This craft of verse - chegando ao Brasil no mesmo ano pela Editora Companhia das Letras, mediante acordo com a Harvad University Press, sendo organizadas pelo professor de Língua e Literatura Moderna da Universidade Western de Ontario, Calin-Andrei Mihailescu, e traduzidas em forma de ensaio, por José Marcos Macedo, contendo 159 páginas dedicadas à poesia – dialogando com autores e textos, de tempos remotos ao moderno, passando por Homero, Cervantes e Joyce, entre outros, sempre recorrendo à memória, ao invés das notas, pois o amarelo já havia lhe tomado as feições das suas pupilas.

O autor de Ficções - poeta, contista, tradutor, crítico e ensaísta, faz, neste livro, um vai e vem no mundo da poesia, destacando tanto poetas conhecidos, assim como alguns poetas não tão conhecidos, ou até esquecidos, delineando temas relacionados ao fazer poético, tais como, o enigma da poesia, a metáfora, a musicalidade da palavra, a possibilidade ou não da tradução poética, o narrar de uma história, bem como, o crer de um poeta, este último, ao falar de si, tanto quanto escritor, tanto quanto leitor voraz que fora - desde a infância em Bueno Aires, quando ouvia de seu pai, num verdadeiro frêmito, o lampejo e o trovoar dos versos de John Keats, experiência que “acontecia não com meu simples intelecto, mas com todo meu ser, minha carne e meu sangue”, e isso para Borges era poesia, algo que ele não poderia definir em palavras, mas sabia onde encontrá-la, pois, “ela está logo ali, à espreita”. Sendo a vida para Borges, feita de poesia, podendo surgir entre nós, a qualquer momento.

Borges deixa claro aos leitores deste livro, que entre ler, analisar e escrever, atos revelados por amor à palavra durante toda sua vida, que o desfrutar era o mais importante para ele - o sorver a poesia, através da sugestão que insinua o verso, não tendo em si, o enigma da construção dos versos a revelar a ninguém, apenas dúvidas a oferecer; somente perplexidades consagradas pelo tempo, e que a poesia embutida por trás das palavras podem saltar para vida, ressuscitando os mortos quando as páginas de um livro são abertas pelo leitor certo, pelo contato, pois para ele, o livro não passa de um objeto físico como tantos outros, porém, o conjunto de símbolos mortos presentes em cada exemplar, as palavras, podem ganhar vida em contato com o leitor, e quando a poesia chega, “sente-se o seu toque, aquela comichão própria da poesia”.



Ao falar da metáfora, uma das razões da existência do verso, Borges exemplifica o tema admitindo a existência de uma dúzia de modelos em torno de centenas ou milhares de projeções metafóricas, “mas isso não precisa nos preocupar, já que cada metáfora é diferente”, não precisando o leitor ter tanta preocupação quanto ao fato, pois, “o importante sobre a metáfora, eu diria, é ser sentida pelo leitor ou pelo ouvinte como uma metáfora”, utilizando a imaginação, indiferentemente do pensamento lógico, que utiliza argumentos – já em poesia, a insinuação, o sugerir através das palavras, pois essas, para Borges, já nasceram poéticas.

“Esse ofício do verso” é aquele típico livro que deve habitar as estantes de todos aqueles que são amantes da arte poética – amantes da poesia, da magia das palavras, da musicalidade dos versos. Pois, nele encontramos, surgindo na alma do poeta, toda paixão e reverência que nos faz acreditar, que por incrível que pareça, ainda em tempos pós-moderno, somos levados a crer que o homem, mais do que tudo, ainda precisa de poesia.

Profº. Robson Luiz Veiga
Mestrando em Literatura e Crítica Literária PUC Goiás