Vai,
menina, ser-gauche-na-vida!
Numa tarde dessas, em que a chuva pede
pra cair, mas o sol soberanamente lhe ordena a ficar, deixe-me deleitar nas
curtas linhas do pequeno livro Oficina de leitura, da pesquisadora,
tradutora e crítica literária Rosemary Arrojo, adepta fiel da consagrada concepção
denominada de "Desconstrução", surgida ainda na década de 1960,
através da pena do francês Jacques Derrida.
Ao
me deparar com a entrada do capítulo 6, denominado de “Exercícios de tradução”,
me detive longamente na releitura dos versos do poeta mineiro Carlos Drummond
de Andrade – Poema de sete faces,
numa análise minuciosa, apresentada por Arrojo, ao comparar o texto original
com a tradução em língua inglesa, da poetisa norte-americana Elizabeth Bishop –
Seven-sided poem, após, é claro, o
ato de leitura e interpretação da própria Rosemary Arrojo, estabelecendo assim,
as diferenças de significado que a mesma fizera da leitura do original em
referência à leitura sugerida pelo texto traduzido.
Até
aí, tudo bem, deu pra perceber que o processo de tradução de um texto poético,
seguindo a linha da corrente contestadora, se origina após o processo de
leitura e interpretação, numa perspectiva que delineia o leitor como coprodutor
de significados, pois, segundo Arrojo, “ler
um poema significa aceitar um convite implícito à criação”, cujo texto, por não ser pronto e acabado, é
uma obra aberta aos olhos do receptor.
De
repente, entre o original, produzido por Drummond, o trabalho de leitura e
interpretação de Arrojo, bem como, a tradução de Bishop, busquei na feira do
tempo, conscientemente, a figura ímpar da educadora paraense Simone Bahia, como
sendo o reflexo da simbologia do “ser-gauche-na-vida”,
segunda a interpretação de Arrojo, na qual significaria “não ser como os demais, ou pensar como os demais”, mas por ter uma
atitude ímpar, singular, entre muitos, e por dizer aberto em sua ética
profissional, tatuado em seu espírito uma postura crítica, um dos mais belos
versos da musicalidade brasileira – “Não
sou escravo de ninguém, Ninguém senhor dos meus domínios”, como pregava
Renato Russo, “porque repetir o mundo, ou
rimar com ele, não é uma solução”, utilizando aqui, as palavras de Arrojo.
No
caso da professora Simone Bahia, um verdadeiro “metal contra as nuvens”, seguindo a linha poética do líder da
Legião Urbana, o sistema resolveu lhe castigar por ser-gauche-na-vida, e por não ser um Raimundo a rimar, exonerando-a
do cargo de coordenadora pedagógica à professora das séries iniciais. Uma prova
viva de que ainda precisamos democratizar a democracia, como bem afirmou a
ex-senadora Marina Silva, principalmente em se tratando da rede pública de
ensino, cujo princípio básico deveria no abrir das tuas portas, incentivar o
hábito da fala crítica dos sujeitos que produzem o processo de ensino-aprendizagem,
a fim de que os estudantes possam tê-los como modelos a serem observados como
elementos atuantes em prol do desenvolvimento social e cultural.
Afinal,
em termos de educação, é melhor ser-gauche-na-vida,
correr perigos e correr mundos, do que ficar a viver feito muitos Raimundos,
num trabalho que só os papagaios nasceram para tal fim: a repetição do
repetível, assentada em versos como estes do Maluco Beleza, “É você olhar no espelho, Se sentir um grandessíssimo idiota, Saber
que é humano, ridículo, limitado, Que só usa dez por cento de sua, Cabeça
animal”.
Robson
Luiz Veiga
Mestrando
em Literatura e Crítica Literária
"Serei-gauche-na-vida!" E com clareza das coisas volto a te dizer que o teu reconhecimento é inigualável Robson Veiga e de suma importância aos profissionais que pretendem fazer a diferença na educação.
ResponderExcluir